sábado, 19 de março de 2011

Você me faz acreditar

Claro que eu queria tudo diferente; cruzar a calçada da tua vida meses antes, ser menos tímido, mais arrojado, teu primeiro amante.

Claro que eu queria tudo diferente; emprestar tuas ruínas, adotar tua explosão, alugar tua ironia, tomar tua vida de assalto.

Claro que eu queria tudo diferente; ser teu par no baile de formatura, o amor da tua infância, a paixão da tua adolescência.

Claro que eu queria tudo diferente; ser o motivo do teu choro, a razão da tua alegria, seu primeiro amor, o último amor.

Claro que eu queria tudo diferente; compor frases em francês, dominar o inglês, conhecer a Europa, ler mais livros e ter um apartamento em Ipanema pra pintar tua vida com bossa nova.

Claro que eu queria tudo diferente; levá-la pro Rio dos anos 1940, transformar a lanchonete que abrigou nosso primeiro encontro em nossa cozinha e te devorar com os olhos, porque a tua pele é a comida mais gostosa que já provei na vida.

Claro que eu queria tudo diferente; fazer parte dos seus 16 anos, ser um pouco mais novo, parecer mais velho, provar que você não é coadjuvante. É protagonista. 

Claro que eu queria tudo diferente; fazer da orla da praia nosso quintal, escrever um livro revisado por você, e dedicado a você, ter sua nudez todos os dias ao meu lado, seu corpo como vizinho em minha cama.

Claro que eu queria tudo diferente; soprar poesia nos teus olhos para dilatar suas pupilas, tirar palavras da tua boca, colocar palavras na tua boca, exaltar tua beleza, violentar tua beleza, fazer troça do que você batizou de defeito, amar o teu defeito. Como eu amo teus defeitos!

Claro que eu queria tudo diferente; expulsar teus fantasmas, sequestrar teu pessimismo, assassinar o medo da decepção, reproduzir prosa e verso em escala industrial pra te bombardear com delicadezas.

Claro que eu queria tudo diferente; provar que meu último amor ficou pra trás não pela distância, mas pelo distanciamento, provar que meu último amor morreu ainda no ventre. Foi ficção, não realidade.

Claro que eu queria tudo diferente; porque o meu novo e único amor pode ser você, só pode ser você, porque você não é “segunda opção”, é prioridade. Foi com você, e só com você, que não me assustei e até simpatizei com a possibilidade de ter um filho. Você acredita nisso? Acredite nisso! Não sei o porquê, mas é verdade. Senti isso.

Claro que eu queria tudo diferente; porque você é diferente, com você é diferente, pode ser diferente. Diz que não pode? Pode! Ainda dá tempo. Você me faz acreditar.

* Perdida em um arquipélago qualquer, Malu Rodrigues - colunista de sábado do Pensamentos de Estante  - cedeu, gentilmente, sua prateleira ao sujeito que cruzou tua calçada há exatos dois meses., com um guarda-chuva azul nas mãos. Prováveis erros ortográficos não devem ser atribuídos à autora.

2 comentários:

  1. Gostei mesmo. Parabéns pela literatura...
    Manuela Legramanti

    ResponderExcluir
  2. Versão adaptada, rs.
    Não gosto de babar ovo.
    Mas que tu é foda, é.
    E eu sou como uma viciada implorando por mais.

    Malu.

    ResponderExcluir