quinta-feira, 7 de junho de 2012

Atuações em um palco invisível



 Não consigo mais acreditar nessa mente que tanto me trai. Que nem nas horas oportunas ela aparece para abrir os meus olhos e ver o meu reflexo, o reflexo de um rosto perplexo e sem reação, nos olhos da garota que poderia vir a amar. As únicas reações são de apenas seguir os seus meros conhecimentos, que tanto achava que iria ajudá-lo.  Esta lamúria que agora dobra a minha feição copia a dela outra hora chorosa em minha frente. Resignei a única oportunidade que tive de ignorar a razão e seguir o sentimento. Tornei-me um mostro. Parece que está tatuado em minha alma o androcentrismo, uma repugnação pelo alento tenro do soluçar daquela mulher que torce os meus braços, morde meu ombro e deita os olhos lacrimejantes sobre eles para curar as pequenas mordidas. Meu sorriso estava a empulhar você. Ele estava apenas a arremedar e gozar daquele momento, como se fosse um trono para o meu ego sentar e desfrutar daquela oportunidade rara. Devia ter lutado mais. Essa incompletude agora agarra o meu coração e o dilacera entre uma risada e outra. As notas de Chopin não vicejam mais. Algo que parecia ser tão edênico agora é tão simples. Sinto-me acaçapado pelo destino que apoia seu pé sobre a minha cabeça e a esmaga contra a parede sem dó. Mas isso tudo vai passar. Não importa o quanto tempo leve, sempre passa. Mas isso tudo irá voltar. Não importa quanto tempo leve, sempre volta. 

terça-feira, 10 de abril de 2012

Aqui foi, por muitas vezes, meu refúgio, mas preciso me despedir. Não vou mais escrever no blog. E vou sumir por um tempo também. Estou esgotada, simplesmente. Preciso descansar. Muito obrigada, meus queridos, por sempre me cederem espaço nesse cantinho tão especial.


Do castanho-breu
Fugiu por medo
Afundou profundo
E prendeu a respiração

I

uma bolha

Fora encontrada
A escuridão a cercava
Embebedou-se do restante de sua alegria
Regurgitou o sorriso

II

duas bolhas

Olhou pro verde-mar
E transbordou um grito incessante
Apavorada
Emudeceu

III

três bolhas

O breu tomou-a, quase inconsciente
Mastiga, cospe, cospe
Intragável
És

IV

última bolha

Dominada pelo breu
Soltou um último suspiro
Coração perfurado
Desfaleceu

Fim do primeiro ato.

- Gina

quarta-feira, 28 de março de 2012

tique-taque-tique-taque-tique-taque

Vivi um amor inteiro. Dei-me como nunca, como se hoje fosse ontem e o amanhã viesse pra nós. Nunca eu, nem você. 

E vivemos aquela intensidade toda. Banhados em vinho, matando outros por nós, matando-nos por mais um pouco daqueles momentos enlouquecedores a serem vistos que olhos fechados.

Tua barba no meu pescoço, minhas pernas na tua cintura. Minha boca dizendo no ar. A tua... Também.

Numa sinceridade tamanha que, quando vi, onde estávamos? Eu me via, te via, mas não nos enxergava. Míope, um emaranhado de letras e sentimentos se punha a mim como um desafio e, como esperado, tropecei. 

Arrastei-me por um tempo, pareceu-me que não fluía: nem o sangue do tombo, nem o tempo tiquetaqueando sem parar. Mas flui. Fluiu. E por fim um abrir de olhos que soou como o primeiro fôlego ao emergir.

-gina

sexta-feira, 23 de março de 2012

...

Querido, sinto saudades do teu sorriso
Ele se abre pra mim como uma flor
E faz o meu se abrir também

Quando todos têm os ombros retraídos
E os olhos frios
Ele me vem como um afago


Uma lembrança boa

Sinto falta da tua alegria
Das tuas risadas largas
Dos teus amores agarrando os meus

Mesmo que outros olhos o veja
E outra boca lhe sorria


E se você se esquecer dos meus lábios lhe sorrindo
Não me preocupo
Aqueço meu corpo
E afasto a lembrança
Ainda que teu sorriso a traga de volta a mim

domingo, 18 de março de 2012

Monólogo


O tempo se dilata e deixa as coisas paradas por um segundo, se não menos, e todas as possibilidades se abrem. Portas, janelas, ouvidos, corações, pernas: tudo, por um momento que não somos capazes de medir ou de mensurar, fica ao alcance mínimo de um gesto. Não é o próprio tempo que faz isso, pois ele não possui mãos nem mente para organizar as coisas assim, mas é ele em conjunto com o próprio existir único e imutável de tudo o que existe.
Talvez não consiga me fazer entender. Veja: há coisas que não vemos e não estão além do céu e não tem nada a ver com algo transcendental e não tem nada de espirituoso em si. Esqueça as luzes e os túneis, as preces por algo melhor depois disso tudo. O que temos é isso, vê, sinta. Sente meu pau duro dentro da sua mão e percebe, respirando o ar, que é isso que teremos pra sempre, não importa o que aconteça.
Meu cu, as pessoas lá fora, pedófilos, estupradores, efebos, cozinheiros, secretárias: para todos nós só resta a força do pau de meter e arrancar, na outra extremidade, o grito.
E tenta perceber que não é por penitência que isso acontece. Não é por que a gente percebe que estamos abandonados que a gente apanha. Não é porque a gente quebra as unhas nessas paredes de terra, se debatendo e rasgando a roupa do corpo que a gente faz as coisas que faz. Tenta perceber que é por força de compensação: não tivemos coisas que queríamos muito, então acabamos por querer de novo elas no futuro, o que acaba depravando o próprio desejo. O que é trancado, o cuspe que se quer jogar ou o salto com que se quer andar, se isso não acontece, vira depravação e bola de pelos depois.
E não pense que meu discurso é misógino: mulher mete também, e muito. Anão, por mais que você nojento, mete também. Corcundas metem com um vigor que você não consegue imaginar. Agora você está conseguindo encaixar as peças? Veja, o céu é sempre escuro, mas a festa continua. Os balões murchos, as serpentinas partidas, o farelo de bolo: a festa, desde o início, já começou pela metade e a gente continua nela. Porque a cidra é de boa qualidade e os convidados são aprazíveis. E a música. Ah, a música!
Então, como eu disse, pega o meu pau e não balança. Esquece das palmas coladas pra cima e reverencia com a língua, pra engrandecer melhor a missa que vai rezar. Vira o cu que eu vou cantar uma ária pra ti; pra vocês dois, porque vocês merecem.
O que foi? Relaxa, dilata. Ficou assustado com as coisas que eu disse? Não tem nada com o que assustar. A monstruosidade toda é espantosamente próxima, mas ela nunca chega a nos tocar; nos arranha, por muitas vezes, e você deve conhecer gente que deixou o pulso sangrar assim. Mas é muito lindo esse aconchego que temos com o abismo porque faz o conforto com o riso mais cheiroso. Viu só como somos poligâmicos por natureza? Dividimos a cama com duas bestas diferentes e é uma delícia. Elas socam gostoso também, mas gostam de que metam nelas de quando em vez. Mas na sua maioria é dupla penetração o tempo todo, desde que você abriu os olhos a primeira vez.
Odeio quando acontece de eu ficar metafórico demais, como agora. Parece que não tem outra forma de eu dizer as coisas que digo sem usar símbolos. Mas pensa comigo: quem não faz isso? Tudo significa alguma coisa que a gente pensa ou faz ou sente. Muitas vezes a gente nem sabe e nunca saberá, pois a matéria em si está num pedaço da cabeça pra onde vão as coisas que se esquecem. A gente esquece e elas próprias esquecem de si. Sim, é freudiano demais, mas me parece a coisa mais certa a se dizer sobre tudo. Todos os povos e as culturas possuem uma interpretação sobre a vida e o mundo e achar que a nossa é melhor que as outras é falta de foder. Os hindus achavam que o mundo era sustentado por uma tartaruga gigante! Deus? Aquele cara branco, que vê tudo, o mais justo de todos, criador de todas as belezas? Pfff, se ele existe, não passa de um narcisista egocêntrico, que tá em algum lugar tocando punheta enquanto olha pro espelho e massageando o peitoral. Como posso enxergar semelhança e ainda por cima me espelhar num cara que não tem o poder dos frágeis, uma pessoa incapaz de se entregar à tragédia dos sentidos, que não tem o caos afligindo a retaguarda e, que ainda por cima, não morre? Não, de velhos sábios e justos já me cansou a mídia brasileira.
E Jesus era um panaca. Não consigo ter como ídolo um homem que parece um personagem de Malhação: assexuado, rosto de modelo e que só pensa no bem do próximo. Dizem que pra ser imparcial só não desejando nenhum corpo, como ele fez. Pra mim isso não passa de um vegetal. Acho até graça: a humanidade toda louvando um alface!
Ah, então você acha graça mesmo? Pensava que estava te cansando todo essa fala. Pensava que você ia embora. Mas não, está sorrindo. Acho que conseguimos expurgar todas as culpas. Não, pra um bom sexo é preciso de uma dose de culpa. E, sim, sorri mais, porque é a única coisa que nos resta. E chocolate. Come chocolates, pequeno!

(sou eu, Cauli, de volta. não sei se só hoje.)

sexta-feira, 16 de março de 2012

Devolva-me

Querido, dei-te meu corpo como em doação. Que resta dele? Os olhos ainda dizem como minhas mãos disseram? A boca ainda escreve como os olhos sussurravam? As pernas ainda caminham em descompasso com o coração?

Se tua presença ainda norteia meus passos tortos, de que adianta mentir a mim mesma quando sei a verdade? Ainda que a ilusão torne tudo tão claro, sua ausência traz a escuridão de desmaio: vem o breu, mas você ainda não chegou ao fim.

Se tuas mãos ainda dilatam minhas veias e esquentam meus sonhos maus, de que uso tem meu corpo em minha posse se sabes que ele é teu?

-gina

quarta-feira, 14 de março de 2012